Programação
1. Abertura: Religião, gênero e sexualidade a partir do prisma da família.
Mediação: Raphael Bispo (UFJF) e Célia Arribas (UFJF)
Patrícia Birman Professora Titular da UERJ
Religião e política: sexualidade e gênero como instrumento de governo das famílias com Thiago Rabelo (UERJ) A sexualidade transformou-se em uma questão aguda e de uso permanente no plano político a partir da emergência de uma extrema direita influente e organizada no espaço público. A nossa exposição visa explorar o uso político da sexualidade e do gênero em casos nos quais as relações em pauta não obedecem às clivagens que usualmente tem controlado a cena social e moral no país, a saber, o domínio evangélico vitorioso em oposição aos cultos afro-brasileiros, destituídos do poder de influência que detinham no passado. Em resumo, queremos analisar tanto como o evangelismo vitorioso quanto as casas de candomblé, atuantes em periferias distintas do Rio de Janeiro, participam de jogos políticos em situações diversas. Em ambos os casos se recorre à sexualidade e ao gênero como instrumentos para se contornar os limites legais relativos à participação religiosa no campo social e político. A sexualidade e o gênero, no nosso modo de entender, vieram a ser instrumentos axiais para se efetivar um certo domínio governamental sobretudo em periferias da cidade. Pretendemos explorar como esses dois temas da sexualidade e do gênero, entrelaçados, têm aberto um campo de intervenção para o governo das famílias em uma perspectiva evangélica, por um lado, e a gestão religiosa das aflições em um horizonte candomblecista, por outro. Em ambos os casos se percebe que as múltiplas relações cultivadas por esses religiosos foram configuradas por intermédio de alianças envolvendo instâncias diferenciadas de governo. No caso dos evangélicos, o valor atribuído à moralidade cristã deu legitimidade a ações governamentais em busca de reconfigurações específicas da lei e de suas aplicações. No caso da casa de candomblé, as situações de perigo de vida enfrentadas por uma parte da sua clientela deram legitimidade a práticas rituais de proteção envolvendo, por sua vez, ilegalismos diversos. Consideramos, a partir dos dois casos que descrevemos, que está em curso o tratamento da sexualidade e do gênero como instrumentos poderosos de ação política que se revelam embebidos em valores religiosos nem sempre explicitamente assumidos.
Luiz Fernando Dias Duarte
Professor Titular da UFRJ
O culto englobante da “família” nos meios populares contemporâneos no Brasil No bojo de investimentos recentes sobre o populismo de direita no Brasil e sobre a noção de pessoa envolvida na sua aceitação e difusão, examino o valor “família” como eixo de uma representação “conservadora” da ordem social hegemônica nos “meios populares” (em um sentido muito lato). Essa “família” engloba o gênero e a sexualidade, e se afirma por um sistema de atitudes baseado no “respeito” e na “autoridade” (não necessariamente masculina). No contexto político atual, é reafirmada como uma revolta explícita contra o modelo moderno da autonomia de gênero e sexualidade em relação à família – e suas implicações morais mais amplas. Busco discutir o sentido dessa combinada e aparentemente contraditória reiteração do modelo hierárquico e da “família nuclear” nos meios populares contemporâneos (contra a família extensa), sobretudo no tocante à relação com as congregações pentecostais e com as redes locais de criminalidade.
Jacqueline Teixeira Professora Adjunta da UnB
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2. Direitos sexuais e Reprodutivos na contemporaneidade.
Mediação: Lorena Mochel (UFRRJ)
Leandro de Oliveira
Professor Adjunto da UFMG
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Célia Arribas Professora Adjunta da UFJF
Militância espírita e descriminalização do aborto: tensões entre conservadores e progressistas A apresentação explora a dinâmica da militância espírita em relação à descriminalização do aborto, considerando as diferentes perspectivas postas em termos de um espiritismo conservador e de um espiritismo progressista. O estudo analisa as posições divergentes entre esses grupos com base em três aspectos: (1) as distintas moralidades espíritas acionadas, (2) os diálogos que elas mantêm com outras religiosidades cristãs, e (3) as reações, de repulsa ou de atração, em relação aos desdobramentos do neoconservadorismo nos últimos anos no Brasil. Conclui-se enfatizando como o aborto pode ser lido, por um lado, como um indicador dos tensionamentos e dos sentidos do que é ser espírita, e, por outro, como uma drágea compacta de várias dimensões da vida social – família, maternidade, cuidados, saúde, divisão sexual do trabalho e de responsabilidades, desigualdades e democracia –, servindo de termômetro para refletir sobre as relações entre política e religião na formulação de leis e de políticas públicas de gênero.
Marcelo Natividade Professor Adjunto da UFRJ
Casamento blindado ou a benção da separação? Percepções sobre Sexo, Amor, Violência e Direitos em igrejas inclusivas A exposição é baseada em artigo publicado na Revista Pagu em que coautoria com Tainá Biela Dias (UMESP/SP) no encontro de nossas pesquisas e materiais. Focaliza dados coletados por mim e por ela em nossas pesquisas individuais, compartilhados para análise. Reflete sobre formas de regulação de sexo e gênero nas igrejas inclusivas ou igrejas LGBTI+ brasileiras, considerando que se trata de movimento que é protagonizado por esse segmento. Elas surgiram no país há mais 20 anos e hoje se assiste a sua institucionalização, acionada pela chegada de uma igreja norte-americana, a Igreja da Comunidade Metropolitana (ICM) no Rio de Janeiro, depois de outras tentativas de implantação em anos anteriores, em outros estados brasileiros. Esse conjunto de denominações é majoritariamente evangélico, ainda que existam iniciativas católicas, espíritas e sincréticas e elas já se espalharam por quase todas as capitais brasileiras. Então, aqui será discutida uma certa forma de construção das subjetividades nas relações entre vida íntima e o cuidado pastoral: como essas igrejas lidam com os relacionamentos afetivo-sexuais, as corporalidades, os afetos, na junção de religião e uma linguagem dos direitos? Como elas elaboram noções de casamento, família, sexo e gênero? Como nos seus discursos e narrativas se forja uma concepção da pessoa LGBTI+ cristã? A comunicação explora essas questões ao tratar de duas vertentes e ênfases dentro desse movimento global brasileiro: um pentecostal, centrado nos modelos de “vida cristã” e outro protestante histórico, de viés mais ativista e identitário. Focaliza distintas respostas das instituições religiosas às lutas dos movimentos sociais e dos direitos sexuais.
Elisa Rodrigues Professora Adjunta da UFJF
Discursos religiosos e práticas de poder: a vocação dos escolhidos de Deus Foucault sugere que a formulação de discursos tem por finalidade mais do que lançar luz sobre matérias obscurecidas pela ignorância: o discurso visa ao controle. Sendo assim, discursar sobre algo pressupõe conhecê-lo e o ato de conhecer concede autoridade e poder a quem conhece. Daí que existe uma relação produtiva entre saber-poder. O que proponho discutir nessa ocasião é a relação de saber-poder implicada nos discursos religiosos cristãos de evangélicos, que pleiteiam o controle dos corpos das mulheres. Que referências bíblicas – um tipo de saber – são acionadas e como são articuladas no interior dos discursos religiosos para legitimar pautas e práticas que desautorizam mulheres a decidirem sobre seus corpos e concedem essa autoridade e poder a terceiros? A problematização de como esses saberes são articulados no interior de discursos religiosos pentecostalizados que entendem deter poder para normatizar os corpos, especificamente, os das mulheres, parece-me produtiva considerando logo de início que subjaz a esses discursos uma lógica mítica. Uma lógica segundo a qual dominar, explorar e usufruir derivaria de um atributo senão uma vocação peculiar ao povo escolhido de Deus.
3. Moralidade, gênero e sexualidade a partir de trajetórias religiosas.
Mediação: Oswaldo Zampiroli (UFRJ)
Raphael Bispo
Professor Adjunto da UFJF
A ética cotidiana das interrupções e dos colapsos morais em trajetórias artísticas evangélicas O objetivo desta apresentação é estudar os momentos de interrupções e de colapsos morais em trajetórias de artistas evangélicas no Brasil contemporâneo; ou seja, analisar os processos de suspensão, paragem, refluxo e (des)continuidade, ocorridos ao longo dos desdobramentos das vidas religiosas de mulheres famosas convertidas ao pentecostalismo. Tendo como base teórico-metodológica a antropologia das emoções e das moralidades, a apresentação pretende debruçar-se sobre as biografias de algumas artistas brasileiras evangélicas. Entende-se que as interrupções são eventos propícios para a produção de dramas morais e emocionais, cunhados por Zigon como momentos de "colapsos morais", por meio de histórias que são contadas de distintas formas discursivas. Nesse sentido, o propósito é acompanhar de maneira pormenorizada as flutuações éticas e subjetivas frente às demandas mundanas e sagradas experimentadas por artistas brasileiras, realçando suas ações para lidar com as incertezas e sofrimentos do cotidiano, através do manejo que fazem das palavras e do modo como narram seus períodos de instabilidade na fé.
Eduardo Dullo Professor Adjunto da UFRGS
O "evangelho de um ateu": testemunho, crítica e desconversão A presente comunicação visa analisar a obra autobiográfica do jornalista Fabio Marton "Ímpio: o evangelho de um ateu", publicada em 2011 pela editora Leya. A intenção é analisar como a experiência pentecostal e familiar do testemunho, presente na narrativa, se transforma em um testemunho da saída da religião e de "desconversão" marcado pela associação da crítica ao pensamento secular. Nesse processo, discutirei as estratégias de crítica: (a) às experiências religiosas vivenciadas e (b) às moralidades conservadoras associadas, evidenciando os processos de produção da subjetividade ético-política atéia e masculina.
André Sidnei Musskopf
Professor Assistente da UFJF
Des/moralizando a fé: teologias e grupos cristãos indecentes A emergência de teologias, igrejas e grupos cristãos LGBTQIAPN+ ou “inclusivas” pode ser localizada na segunda metade do século XX no contexto de diversas transformações políticas e sociais. Desde então, tais discursos e práticas passaram por diversas transformações que tensionaram tanto o campo cristão hegemônico, quando o próprio campo “inclusivo”. Nessa apresentação, será apresentado um panorama do surgimento e desenvolvimento das teologias e grupos cristãos LGBQIAPN+ a partir da categoria da “indecência” (Althaus-Reid), refletindo sobre o potencial de des/moralização da fé que as diferentes práticas ensejam. A partir desse panorama será discutido o recente fortalecimento de grupos políticos de extrema-direita e seu ataque às questões de diversidade sexual e de gênero para refletir sobre o lugar das teologias e grupos cristãos indecentes
Maria Elvira Diaz-Benitez
Professora Associada da UFRJ
A experiência da fé em mulheres agredidas com agentes químicos Pretendo abordar nesta apresentação os enunciados sobre a fé na recuperação de mulheres que sofreram ataques com agentes químicos, tiveram rosto e parte de seus corpos desfigurados e adoecidos e viram suas relações familiares afetadas. Fé é a forma como as mulheres nomeiam uma energia profunda que vivem de modos muito subjetivos e que as ajudam a retomar os rumos de suas vidas após a experiência de uma grave violência. Mas a fé que elas experimentam é “difusa”, isto é, enfatiza um encontro com algo espiritual, com uma força misteriosa que podem chamar de diversas formas, inclusive de Deus. Sem se abraçar a uma religião exclusiva, mas no meio a uma experiência religiosa, essa energia experimentada é descrita, por momentos, com outra expressão: milagre. Se bem esse milagre pode vir de algo que interpretam que está na ordem do divino, também aparece como gestos da vida ordinária que as fazem “retornar” e reassumir, para algumas, o lugar de mães. A maternidade é vivida como essa força mística de onde retiram a fé. Para outras, fé é aquilo que emana do olhar ou das palavras de outra mulher agredida, de um processo de cicatrização mais ou menos bem sucedido, de um aceitar vagaroso do novo semblante, e por aí vai. A fé é vivida, em poucas palavras, como uma potência às vezes externa, às vezes interna, que é capaz de fazer o mundo se mexer para a frente.
4. Política, conservadorismos e resistências.
Mediação: Carly Machado (UFRRJ)
Leandro de Paula
Professor Adjunto da UFBA
Os públicos de uma zona cinzenta: gênero e teologia entre ministérios protestantes No Brasil, a recepção de discursos feministas pelo campo evangélico mais amplo tem sido marcada por antagonismos e também por tentativas de articulação, suscitando posições divergentes sobre deveres e direitos das mulheres. O processo político ocorrido na última década animou o surgimento de coletivos, manifestos, cursos, candidaturas, dentre outras formas de representação do tema. Lideranças como Damares Alves, Michelle Bolsonaro e Ana Campagnolo, por um lado, ou iniciativas como “Evangélicas pela igualdade de gênero” e “Frente evangélica pela legalização do aborto”, por outro, tornaram-se índices das trincheiras às quais o feminismo convoca fiéis brasileiras. Minha participação no Simpósio buscará explorar uma zona cinzenta desse debate ao apresentar ministérios surgidos a partir de 2015 que se propõem a empreender uma reforma dos modelos de “feminilidade” dispostos pelas igrejas do protestantismo histórico no país. Conduzidas por jovens presbiterianas e batistas, essas iniciativas particularizam-se por uma crítica a programas de gênero vigentes que, no entanto, não adere a reivindicações identitárias ou à agenda política do movimento feminista. A apresentação discutirá essa aparente ambiguidade, com foco nas bases teológicas calvinistas e nas concepções de vida pública que inspiram tais ministérios.
Ricardo Mariano Professor da USP
Ativismo político evangélico em confronto com o pluralismo A apresentação aborda o ativismo político evangélico conservador e de direita, enfocando seus anseios de “supremacismo cristão” na cultura, na sociedade, nas instituições públicas e no ordenamento jurídico e seu protagonismo na disputa pelo controle da moralidade privada ao combater coletivos feministas e LGBTs, pautas de desigualdade e violência de gênero, projetos de lei e políticas públicas em defesa de Direitos Humanos, sexuais e reprodutivos.
Marcelo Ayres Camurça
Professor Titular da UFJF
Política, conservadorismo e resistências no catolicismo brasileiro Contemporâneo Nos anos recentes da conjuntura política brasileira assistiu-se um avanço de uma extrema direita cristã com iniciativas e projetos extremamente conservadores para a sociedade no campo da moral e dos costumes. Ficaram mais evidente as ações do segmento evangélico pentecostal, no entanto setores expressivos do catolicismo somaram-se a estas investidas. Pretendo chamar atenção nesta intervenção para esta questão, com exemplos conjunturais do período 2018-2022; assim como com uma tentativa de interpretação de suas motivações. Como contraponto, apresento iniciativas do dito setor progressista da Igreja Católica que se confrontam com as ações hiper-conservadoras apresentando num sentido contrário, argumentos e ações principalmente no campo social. Por fim apresento como “pano de fundo” a situação do papado de Francisco e como a tensão vivida no catolicismo brasileiro entre conservadores x progressistas é também um reflexo da do quadro universal da Igreja Católica.
Sandra Hanson
Emeritus Professor - CUA
African American Women in STEM: Sources of Resistance to Gendered Science Norms. Vivamus tincidunt, sapien non interdum accumsan, sapien justo fermentum nisi, non posuere felis lacus ut turpis. Fusce tempor urna ut ex elementum, id auctor felis pharetra. Curabitur venenatis, elit non aliquet volutpat, lacus erat ornare metus, et faucibus turpis lorem sit amet lorem.
5. Tecnologias de gênero e experiências artístico-religiosas.
Mediação: Leandro de Oliveira (UFMG)
Lorena Mochel Estágio Pós-Doutoral na UFRRJ
Guerrear pelo áudio: paisagens sonoras do cotidiano evangélico no WhatsApp Pesquisar com mídias digitais indicou para múltiplas sensorialidades que emergem da relação de mulheres pentecostais com o sagrado. A partir da análise etnográfica de paisagens sonoras formadas por mensagens de voz em dois grupos de oração no WhatsApp, reflito sobre como o som produz mediações que materializam a presença divina através do compartilhamento de orações e pregações. Nos “quartinhos de oração”, em deslocamentos no transporte público ou no banheiro do trabalho, orar junto produz intimidades fortalecidas através de coletividades imaginadas em comunhão. Os áudios, nesse contexto, operam como tecnologia inclusiva para o trabalho de cuidado doméstico, além de aproximar mulheres “desviadas” do cotidiano devocional. Os usos do WhatsApp evidenciam paisagens sonoras que centralizam o lugar desta mídia para a reconfiguração de institucionalidades evangélicas.
Nina Rosas Professora Adjunta da UFMG
Celebridade evangélica e um congresso de mulheres empoderador: Ana Paula Valadão e a psicologização do religioso A literatura socioantropológica dos últimos 30 anos identificou que a religião evangélica opera de maneira ambivalente, tanto repondo a autoridade dos homens quanto reorganizando as relações familiares e os papéis de gênero, de modo a aumentar a autonomia das mulheres. A partir da análise dos congressos organizados pela pastora Ana Paula Valadão, em 2022 e 2023, visa-se exemplificar as continuidades do discurso evangélico e o modo como, mais recentemente, ele se atualiza. Se, de um lado, é mantida a tônica na submissão conjugal e na maternidade, por outro, se promove uma conscientização sobre a violência doméstica. Nesse sentido, a oferta de cura/transformação pessoal vem se dando sobretudo a partir da mobilização da legitimidade da ciência e da validade de determinadas práticas terapêuticas. Interpreta-se isso como certo "empoderamento" da audiência, chamado aqui de “efeito feminista” a partir de um enquadramento conservador.
Márcia Leitão Pinheiro
Professora Associada da UENF
Música, religião e cor: fazeres e tensões entre mulheres evangélicas No Brasil, a música gospel é registrada desde os anos 1990 e compreende a apropriação de estilos sonoros seculares. Esse gênero musical tem possibilitado analisar a relação entre religião e questão racial, sobretudo a concepção acerca das musicalidades negras. Assim, de um lado, restringe-se a sua entoação nas igrejas e, de outro, ocorre a organização de espaço direcionado a sua execução - fora dos templos. A presença dessas musicalidades no cenário musical evangélico nem sempre corrobora a discussão sobre gênero, sobre racismo e suas consequências no meio evangélico. A fim de proporcionar novos elementos voltados à reflexão sobre religião e música, esta proposta visa abordar as iniciativas realizadas por mulheres negras evangélicas, que têm inserção e/ou relação com a vertente que tensiona a visão de mundo ancorada no conservadorismo evangélico. A partir de entrevistas em profundidade, textos e vídeos dispostos em redes sociais, procuro focalizar o espaço que mulheres negras evangélicas elaboram com a prática musical. Elas podem compreender fazeres voltados a refletir a diversidade musical, bem como explicitar e questionar a visão hegemônica sobre as desigualdades de raça e gênero no meio evangélico.
Emerson José Sena
Professor Associado da UFJF
Corpos instagramáveis, religião fragmentada, gêneros turvos: os novos destroços ontológicos em tempos capitalistas A presente fala pretende abordar como, na era do capitalismo neoliberal de plataformas, a inflação do signo e a exaustão imagética, destroçaram a ontologia entre religião e arte, e aturdiram as tecnologias que produzem gênero. Todo o campo entre arte-religião-gênero foi lançado em um instável território que oscila entre o identitarismo religioso e/ou político e a liberdade e fluidez. A partir de vídeos sobre danças religiosamente orientadas postados no Instagram, indago se os confins da fronteira religião-arte-gênero são refúgios da ontologia e da fixidez identitária ou se tornaram destroços secularizados, mergulhados no hiper-realismo e na explosão dos signos. O hiper-realismo e a inflação semiótica, aumentados no contexto do capitalismo financeiro-neoliberal-digital, submergem a capacidade semântica (interpretação), e, com isso, a capacidade de pensar com clareza e de organizar a vida social em princípios mais igualitários e justos. Os debates e narrativas sobre religião-arte-gênero passam a girar em falso,e, por isso, oscilam numa dança entre fragmentos essencializado-fixos e liberdade radicalizada. Nesse contexto, o Instagram, uma das mais importantes redes sociais em termos de interações, compartilhamentos e postagens, tornou-se definidor de tendências de design e estética. Essa rede é um dos muitos rizomas do capitalismo neoliberal de plataformas e pode ser vista como um paradigma das mudanças radicais no cenário entre o religioso-artístico e o gênero. Quais configurações esse cenário assumirá, não se sabe, mas, é possível elaborar narrativas que ampliem nossos horizontes e, consequentemente, nossa capacidade de ação política.
6. Encerramento: Religião, Gênero e Sexualidade na esfera pública brasileira.
Mediação: Nina Rosas (UFMG)
Maria José Rosado
Professora da PUC-SP
Conservadorismos religiosos e as disputas em torno dos direitos das mulheres Os últimos anos têm sido marcados por um recrudescimento dos conservadorismos de caráter político, econômico e social, em âmbito transnacional, extrapolando fronteiras geográficas e culturais, articulando forças extremistas. Também no âmbito das religiões de matriz cristã – Catolicismo e Evangelismo – expressões contemporâneas desse conservadorismo têm atingido sobremaneira o campo dos direitos sexuais e dos direitos reprodutivos. Mulheres e homens, meninas e pessoas que gestam têm suas vidas afetadas pela incidência religiosa sobre suas decisões no âmbito da sexualidade – do sexo, do prazer – e da possibilidade humana de se reproduzir. Essa investida conservadora pode ser compreendida como reação a conquistas consagradas especialmente a partir das reuniões internacionais promovidas pela Organização das Nações Unidas (ONU) na década de 90: no Cairo (Egito) – Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (1994) , e em Beijin (China), na IV Conferência Mundial sobre a Mulher (1995). Foi nesse contexto que o conceito de Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos ganhou reconhecimento internacional. Após a década de 90, a reação à afirmação da sexualidade e da reprodução como esfera de direitos e de efetivação de cidadania tornou-se um campo de disputa com a moralidade religiosa e as forças conservadoras da sociedade. A luta feminista afirmando o acesso ao aborto como questão de saúde pública e de direito ampliou a base social de apoio à legitimidade de sua reivindicação diante do Estado. Alguns países da região consagraram leis que estabelecem a obrigação dos Estados de proverem serviços públicos de abortamento nos hospitais. Nesse contexto, forças conservadoras religiosas e laicas articulam-se em tentativas constantes, especialmente nos vários níveis do âmbito legai, contrapondo-se às conquistas alcançadas. As disputas dão-se também no campo das narrativas públicas. Conceitos como liberdade de expressão, liberdade religiosa, liberdade de consciência e seu correlato: objeção de consciência, são acionados para dificultar ou impedir o acesso ao procedimento do aborto. Pesquisas acadêmicas acionam dispositivos teóricos e campos empíricos para desvendar processos e mecanismos presentes nas disputas em torno dessas questões. O ativismo político favorável e contrário aos direitos sexuais e reprodutivos apresenta-se na arena pública com forte componente religioso, mobilizando a sociedade. A complexidade desse processo é parte da proposta do Seminário realizado na UFJF e a expectativa ao final é que tenha instigado novas pesquisas em torno desse objeto.
Reginaldo Prandi
Professor Emérito da USP
Gênero e senioridade nas religiões dos orixás O fato de o candomblé ser uma religião politeísta conta muito em sua capacidade de ser uma religião receptiva, inclusiva e tolerante, que aceita a diferença e incentiva seus fiéis a serem o que são. Rejeitados pelas religiões majoritárias em razão de seu gênero e até por suas atividades consideradas anti-sociais encontram portas abertas no candomblé e outras religiões afro-brasileiras. Para a religião dos orixás, cada ser humano tem sua própria origem, que não é a mesma para todos e todas. O importante é seguir as orientações dessa origem diversificada, ou seja, o orixá pessoal. Não há regras iguais para o conjunto dos fiéis. Outro ponto importante a analisar é que a língua da cultura iorubá, que modelou o candomblé, não tem gênero. Orixá não tem gênero, o nome das pessoas não tem gênero, nada tem gênero. Assim, o gênero não tem lugar de destaque na definição de papéis e o que conta mesmo é a senhoridade, à frente do gênero. Há complicações, certamente, decorrentes da mentalidade classificadora europeia e seu esquema masculino versus feminino. O encontro com o catolicismo complicou mas não apagou de vez essas características originais.
Christina Vital da Cunha
Professora Associada da UFF
Retórica da perda e utopia entre extremistas e neoconservadores no Brasil: o resgate da tradição, da autoridade e da “masculinidade viril”. Nesta comunicação que comporá a mesa de encerramento do evento I Simpósio Nacional GenReS - Gênero, Religião e Sexualidade: desafios contemporâneos pretendo levantar reflexões baseadas em um trabalho de pesquisa longitudinal e que continua em curso acompanhando políticos e religiosos que mobilizam uma gramática cristã (pentecostal e também católica) em performances públicas enfatizando ao mesmo tempo utopias, medos e os sentimentos de ameaça e perda em cuja recuperação da segurança, autoridade e da “virilidade masculina” se pronunciam como “solução”. As performances fortes dos atores em campo (Alexander, 2014) são meios de acesso às estratégias corporais, sensoriais e discursivas dos atores conservadores e extremistas na tentativa de obtenção de resultados políticos, culturais e religiosos. Um ponto comum se estabelece em torno de uma utopia em recuperar o passado, o que Bauman (2017) chamou de retrotopia. Em nosso caso estudado, especificamente, um passado no qual padrões de gênero e a autoridade masculina se faziam valer no espaço público e privado (supostamente) organizando a vida social, política, religiosa e “do lar” na forma de uma Retórica da Perda (Vital da Cunha 2020). Os casos mais recentes de observação são políticos e líderes religiosos evangélicos e ADEs (aliados dos evangélicos), formado por um grande campo de parlamentares e políticos eleitos em legislaturas passadas e que acionam situacionalmente sua identidade ora católica, ora evangélica e, ainda, cristã como passamos a observar com destaque a partir de 2018 no Brasil.
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